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RECOMENDAÇÃO Nº 029, DE 27 DE ABRIL DE 2020.

Recomenda ações relativas ao combate ao racismo institucional nos serviços de saúde no contexto da pandemia da Covid-19, provocada pelo novo coronavírus, SARS-CoV-2.

O Presidente do Conselho Nacional de Saúde (CNS), no uso de suas competências regimentais e atribuições conferidas pelo Regimento Interno do CNS e garantidas pela Lei nº 8.080, de 19 de setembro de 1990; pela Lei nº 8.142, de 28 de dezembro de 1990; pelo Decreto nº 5.839, de 11 de julho de 2006; cumprindo as disposições da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 e da legislação brasileira correlata; e 

Considerando que o Art. 3º, inciso IV da Constituição Federal de 1988, prevê que um dos objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil é a promoção do bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação;

Considerando que o Art. 196 da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, que determina que a saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação;

Considerando as diretrizes e moções aprovadas na 16ª Conferência Nacional de Saúde (8ª + 8), publicadas por meio da Resolução CNS nº 617, de 23 de agosto de 2019;

Considerando a Declaração de Emergência em Saúde Pública de Importância Internacional emitida pela Organização Mundial de Saúde (OMS), em 30 de janeiro de 2020, em decorrência da nova doença por coronavírus, a Covid-19 (contaminação pelo vírus SARS-CoV-2, Novo Coronavírus);

Considerando a Portaria nº 188, de 03 de fevereiro de 2020, do Ministério da Saúde, que declarou Emergência em Saúde Pública de Importância Nacional (ESPIN), em decorrência da nova doença por coronavírus, a Covid-19 (contaminação pelo vírus SARS-CoV-2, Novo Coronavírus);

Considerando a Lei nº 13.979, de 06 de fevereiro de 2020, que estabeleceu medidas para o enfrentamento da Emergência em Saúde Pública de Importância Internacional decorrente da nova doença por coronavírus, a Covid-19 (contaminação pelo vírus SARS-CoV-2, Novo Coronavírus) visando à proteção da coletividade;

Considerando que a Portaria nº 639/MS, de 31 de março de 2020, que instituiu a Ação Estratégica "O Brasil Conta Comigo - Profissionais da Saúde", com o objetivo de proporcionar capacitação aos profissionais da área de saúde nos protocolos clínicos do Ministério da Saúde para o enfrentamento da Covid-19, não aborda questões referentes às populações vulneráveis na capacitação dos profissionais da área de saúde para o enfrentamento à pandemia do Novo Coronavírus, a Covid-19;

Considerando balanço feito pelo Ministério da Saúde, segundo o qual um em cada quatro brasileiros hospitalizados com Síndrome Respiratória Aguda Grave é negro (23,1%) e que esse número chega a um em cada três entre os mortos (32,8%), o que se explica tanto pela maior vulnerabilidade e exposição à contaminação por parte dessa população quanto pelas doenças pré-existentes, como doença falciforme, hipertensão e diabetes; 

Considerando a maior necessidade de acesso aos equipamentos de saúde do Sistema Único de Saúde (SUS) por parte das populações vulneráveis como a População em Situação de Rua, por exemplo, e as condições de racismo estrutural que se reproduzem em todos os ambientes sociais, entre os quais, os serviços de saúde;

Considerando as inúmeras denúncias de racismo institucional que têm sido reportadas por entidades da sociedade civil quanto à o impedimento de receber pessoas em situação de rua tanto nos postos de saúde quanto nos institutos de perícia, como ocorreu no Instituto de Perícia do Rio Grande do Norte – ITEP/RN;

Considerando situações inadmissíveis como a que passou o senhor Everaldo da Silva Fonseca, de 62 anos, que acompanhava sua esposa Maria Gonçalves Lopes no Hospital Dom João Becker, na cidade de Gravataí, no Rio Grande do Sul, quando foi acusado de furtar o celular de uma auxiliar de enfermagem, depois de ser submetido a situações vexatórias e humilhantes, perdeu a sua esposa, que não resistiu e faleceu em meio à situação após sofrer um ataque cardíaco;

Considerando a Resolução nº 16, de 30 de março de 2017, pactuada pela Comissão Intergestores Tripartite (CIT), que dispõe sobre III Plano Operativo da Política Nacional de Saúde Integral da População Negra, que contempla um conjunto de ações e serviços, entre eles capacitação de profissionais de saúde para enfrentamento do racismo na saúde, com o objetivo de estabelecer estratégias de aplicação da Política Nacional de Saúde Integral da População Negra (PNSIPN), para garantir o acesso da população negra a ações e serviços de saúde, de forma oportuna e humanizada, contribuindo para a melhoria das condições de saúde desta população, para a redução das iniquidades de raça/cor, gênero, identidade de gênero, orientação sexual, geracionais e de classe, bem como para a promoção da qualidade de vida de brasileiras e brasileiros;

Considerando que a Comissão Intersetorial de Promoção de Políticas da Equidade do Conselho Nacional de Saúde (CIPPE/CNS), acompanha com extrema preocupação situações como as ocorridas no Rio Grande do Norte e no Rio Grande do Sul, e declara falta de ações consistentes de enfrentamento ao racismo institucional no contexto atual de crescente demanda por atendimentos e ampliação da sobrecarga do SUS em face da pandemia de Covid-19;

Considerando o disposto na Política Nacional de Atenção Integral às Pessoas com Doença Falciforme e outras Hemoglobinopatias, aprovada pela Portaria nº 1391/2005-MS; na Política Nacional de Atenção Integral à Saude da População Negra (PNSIPN), publicada pela Portaria nº 992/2009-MS e na Política Nacional de Humanização do SUS (PNH);

Considerando a necessidade de monitorar permanentemente os processos de construção do controle social e da democracia participativa, na busca da garantia dos princípios da equidade, integralidade e intersetorialidade nas três esferas de governo, mediante estudos integrados do controle e participação social na saúde, capazes de subsidiar iniciativas técnicas, políticas e de coordenação; e

Considerando as atribuições conferidas ao Presidente do Conselho Nacional de Saúde pela Resolução CNS nº 407, de 12 de setembro de 2008, Art. 13, Inciso VI, que lhe possibilita decidir, ad referendum, acerca de assuntos emergenciais, quando houver impossibilidade de consulta ao Plenário, submetendo o seu ato à deliberação do Pleno em reunião subsequente.

Recomenda ad referendum do Pleno do Conselho Nacional de Saúde

Ao Ministério da Saúde, às Secretarias Estaduais e Municipais de Saúde e aos Conselhos de Saúde dos Estados, Municípios e do Distrito Federal que orientem os profissionais dos serviços de atenção à saúde, incluindo gestores, prestadores e todas as profissões da saúde, entre outras, com as seguintes estratégias:

  1. A atuação deve ser realizada de maneira antirracista em todo o manejo com os pacientes em situação de vulnerabilidade, como população negra, populações tradicionais (quilombos e terreiros), população em situação de rua, população ribeirinha, população cigana, do campo, das águas e das florestas, dentro do trato da pandemia por Covid-19 e outras patologias;
  2. Os procedimentos de acolhida das pessoas nas portas dos serviços de saúde, bem como todo o atendimento devem ser realizados com a promoção da equidade em saúde, sem nenhum tipo de discriminação de raça-cor, etnia, sexual, de gênero, idade, religião entre outros;
  3. O acesso das populações vulneráveis aos serviços de saúde da atenção básica, deve ser garantido e realizado em tempo adequado ao atendimento das necessidades de saúde, conforme a Política Nacional de Atenção Básica (PNAB), e com especial atenção às emergências provocadas pela nova doença por coronavírus, a Covid-19;
  4. As ações de enfrentamento das altas taxas de mortalidade das populações vulneráveis devem ser priorizadas, tendo em vista o acolhimento das populações do grupo de risco e as ações de enfrentamento ao racismo institucional;
  5. Devem ser envidados todos os esforços para a inserção da temática étnico-racial nos processos de trabalho e educação permanente das equipes de atenção básica e dos trabalhadores/profissionais de saúde do SUS, com especial atenção ao quadro de emergências provocado pela nova doença por coronavírus, a Covid-19;
  6. A atuação da população negra nos espaços de participação, controle social e da gestão participativa da saúde devem ser mais uma vez estimuladas e ações como o trabalho de desinfecção e limpeza urbana organizada por pessoas das próprias comunidades e favelas devem ser apoiadas, inclusive, financeiramente;
  7. A coleta, a análise e a publicação dos dados desagregados por raça/cor devem ser realizadas com vistas a produzir a representação mais próxima da realidade e à elaboração das melhores soluções no enfrentamento à nova doença por coronavírus, Covid-19, de acordo com a realidade social e populacional brasileira;
  8. Produzir instrumentos e indicadores para enfrentamento, acompanhamento e monitoramento dos serviços de saúde com vistas a coibir práticas de racismo institucional, bem como elaborar instrumentos com orientações específicas que se fizerem necessárias à observância da PNSIPN e ao combate à nova doença por coronavírus, Covid-19, respeitando-se as realidades, demandas e necessidades locais.

FERNANDO ZASSO PIGATTO

Presidente do Conselho Nacional de Saúde

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