O consumo indiscriminado de medicamentos
causa preocupação nas
autoridades brasileiras e nos especialistas
da área farmacêutica
No
Brasil existe uma farmácia (ou
drogaria) para cada 3.300 habitantes
e o País está entre os
dez que mais consomem medicamentos no
mundo, segundo dados do Conselho Federal
de Farmácia. O acesso a farmácias
e drogarias e a facilidade na aquisição
de medicamentos no popularmente conhecido
"balcão da farmácia"
promovem um aumento no consumo de medicamentos
pela maioria da população
brasileira.
Para especialistas, o consumo nacional
de medicamentos estaria relacionado
ao difícil acesso aos serviços
de saúde; ao hábito do
brasileiro em fazer uma automedicação,
e ao fato do medicamento ser considerado
uma mercadoria que pode ser adquirida
e consumida sem a orientação
devida. De acordo com estimativas da
Organização Mundial da
Saúde (OMS), cerca de 50% dos
usuários de medicamentos o faz
de forma incorreta.
No País, existe uma cultura de
que a farmácia é um mero
comércio e o medicamento é
uma mercadoria como outra qualquer e
isto tem estimulado, e muito, o consumo
de medicamentos de forma indiscriminada,
comentou o farmacêutico e conselheiro
nacional, Francisco Batista Júnior.
Para ele, somente a prescrição
médica não vai prevenir
a automedicação. "A
mudança passa pela correta orientação
do farmacêutico no estabelecimento
farmacêutico. Essa correta informação
é fundamental para mudar a cultura
das pessoas", defendeu Francisco
Júnior. Segundo ele, é
importante que a pessoa saiba o que
é o produto que está adquirindo,
a ação que vai acontecer
em seu organismo ao consumir a substância
e das incompatibilidades que existem
em relação ao medicamento,
assim como a responsabilidade de tomá-lo
corretamente.
"A Organização Mundial
da Saúde define o medicamento
como um produto farmacêutico para
recuperação ou manutenção
da saúde. Dessa forma, isto quer
dizer que o produto na prateleira realmente
é mercadoria. Ele passa a ser
medicamento no momento que é
orientado para isto, seja por uma prescrição
ou diagnóstico e terapêutica
específica", alertou o Presidente
do Conselho Federal de Farmácia
(CFF), Jaldo de Souza Santos.
De acordo com informações
da Agência Nacional de Vigilância
Sanitária (Anvisa), o uso indiscriminado
de medicamento, facilitado pelo acesso
de uma parte da população
"ao comércio", leva
a população a um processo
de risco à saúde e até
a morte.
Os medicamentos de maior uso pela população
brasileira são: anticoncepcionais,
analgésicos, descongestionantes
nasais, antiinflamatórios e alguns
antibióticos, adquiridos no balcão
da farmácia sem nenhuma dificuldade.
Para os especialistas, a população
precisa atentar para ao uso desses medicamentos,
pois a utilização inadequada
de antiinflamatórios pode levar
à falência renal e, de
antibióticos, pode causar resistência
do organismo a substâncias que
tratam infecções ou doenças
que precisam de medicamentos nesta linha.
Preocupada com esse crescente consumo,
a Anvisa está implementando ações
para promover a utilização
correta e segura dos medicamentos comercializados,
por meio de "alertas" à
população em relação
ao consumo de substâncias que
possam provocar a chamada reação
adversa (reação que as
pessoas podem ter com medicamentos ou
substâncias que venham a usar).
Para Murilo Freitas Dias, Chefe da Farmacovigilância
da Anvisa, a busca do paciente em resolver
o seu problema de saúde (autocuidado)
deve acontecer naturalmente. Em sua
opinião, o hábito da população
não pode levar a um processo
de risco. Outra preocupação
da Anvisa é quanto ao uso de
medicamentos promovidos por propagandas,
recomendações de familiares,
vizinhos, colegas, que faz parte da
cultura do brasileiro e pode levar a
risco e, em alguns casos, até
a morte. "Esse consumo facilitado
pelo acesso de uma parte da população
aos medicamentos pode estar conduzindo
ao uso indiscriminado de substâncias
nocivas ao organismo", lembra Murilo
Dias.
Para Maria Eugênia Cury, Presidente
da Federação Nacional
dos Farmacêuticos (Fenafar) e
conselheira nacional, a cultura da automedicação
foi introduzida na cultura do povo brasileiro
de forma deliberada para que o mercado
pudesse se expandir.
"Existiu um preparo de mercado
de medicamento no Brasil, onde durante
muito tempo a legislação,
as entidades, os órgãos
responsáveis e a política
de saúde permitiram que a indústria
farmacêutica tivesse como criar
o seu próprio espaço para
ter mercado de medicamentos. Então,
a exigência da receita médica
ficou no papel. Houve responsabilidade
de todos os lados para que este hábito
se tornasse grave como está agora",
lembrou Maria Eugênia.
As farmácias de manipulação
têm se configurado como uma alternativa
entre os usuários e profissionais
que querem tratamento personalizado.
Para Júlio Maia, farmacêutico
deste ramo, "as dúvidas
que o paciente tem em relação
aos medicamentos manipulados são
dissipadas pelo farmacêutico no
próprio estabelecimento e a compra
indiscriminada é evitada".
Enquanto a solução para
problemas tão graves não
chega, fica a frase de um poeta canadense
sobre os medicamentos: "Os antibióticos
são medicamentos tão potentes
quanto as ogivas nucleares, o médico
prescreve, o paciente compra e o organismo
utiliza na técnica do arquiflecha".
Farmacovigilância
- é a ciência relativa
à detecção, avaliação,
compreensão e prevenção
dos efeitos adversos ou quaisquer problemas
relacionados a medicamentos.
Reação Adversa ao Medicamento
- é qualquer efeito nocivo, não
intencional e indesejado, de uma droga
observada com doses terapêuticas
habituais em seres humanos para fins
de tratamento, profilaxia ou diagnósticos.
Notificação
Voluntária - é o ato universalmente
adotado na farmacovigilância que
consiste na coleta e comunicação
de reações indesejadas,
manifestadas após o uso dos medicamentos.
O notificador deverá não
só comunicar as suspeitas de
reações adversas, como
também as queixas técnicas
relativas ao medicamento.
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