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Em reunião do CNS, indígenas denunciam abandono e ilegalidade em território Yanomami

  • Publicado: Segunda, 21 de Março de 2022, 16h13
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Invasão dos territórios pela mineração, avanço do garimpo ilegal, pistas de pouso clandestinas, contaminação por mercúrio e ameaças de garimpeiros estão cada vez mais frequentes dentro do território Yanomami, no norte do Brasil. Além disso, a desnutrição severa e o alto índice de mortalidade infantil marcam as condições de vida e de saúde das crianças. As denúncias foram feitas em reunião promovida pelo Conselho Nacional de Saúde (CNS), através da Comissão Intersetorial da Saúde Indígena (Cisi), na sexta (18/03), em Brasília.

O encontro contou com a participação de indígenas, pesquisadoras(es), conselheiras(os) nacionais de Saúde, representantes da Secretaria Especial de Saúde Indígena (Sesai), do Ministério da Saúde, da Fundação Nacional do Índio (Funai) e do Ministério Público Federal (MPF). Na ocasião, o Fórum de Lideranças Yanomami e Ye’kuana entregou uma carta ao CNS e MPF, onde constam as denúncias dos povos indígenas.  

Os territórios do povo Yanomami ficam localizados em Roraima e Amazonas, com a presença de 29.633 indígenas. Segundo informações do Conselho Distrital de Saúde Indígena (Condisi) do Distrito Sanitário Especial Yanomami e Ye’kuana (Dsei-Y), eles estão divididos em 366 aldeias, duas etnias e falam cinco línguas.

Um estudo realizado pela Escola Nacional de Saúde Pública Sergio Arouca (Ensp/Fiocruz) na população indígena Yanomami, em 2019, apontou que a contaminação por mercúrio, utilizado no garimpo para viabilizar a separação do ouro dos demais sedimentos, compromete gravemente a saúde desta população. 

A pesquisa constatou a presença de mercúrio em 56% das mulheres e crianças da região de Maturacá, no Amazonas. As 272 amostras de cabelo analisadas superaram o limite de 2 microgramas de mercúrio por grama de cabelo tolerado pela Organização Mundial da Saúde (OMS).  De lá pra cá, a invasão de garimpeiros ilegais que ameaçam a vida dos indígenas só aumenta.

Entre as denúncias feitas pelos Yanomamis que participaram da reunião do CNS, está a ocupação de uma Unidade Básica de Saúde (UBS) pelos garimpeiros. “A situação da comunidade Homoxi é muito complicada. A UBS foi ocupada para ser depósito dos garimpeiros e a Funai tem conhecimento disso”, afirma o presidente do Condisi Dsey-Y, Junior Hekurarl Yanomami.

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Mercúrio

O mercúrio provoca alterações diretas no sistema nervoso central, causando problemas de ordem cognitiva e motora, perda de visão, doenças cardíacas entre outras debilidades. Por ser um metal pesado, o mercúrio tem longa permanência nos ambientes, no solo, na água, nuvens, florestas e peixes, que é a principal forma de contaminação dos povos.

“Já chegamos a constatar que, mesmo depois de 30 anos, o mercúrio continua presente nos cabelos dos indígenas”, afirma o médico e pesquisador da Fiocruz Paulo Cesar Basta. “No ano passado, a Funai proibiu a entrada dos nossos pesquisadores que desenvolveriam nova pesquisa sobre esta contaminação”.

Maior mortalidade infantil do mundo

A situação no território se agrava ainda mais pelos casos de pneumonia, malária e desnutrição severa de crianças Yanomamis. “Enquanto crianças não indígenas sofrem de 4% de déficit de peso para idade, as crianças indígenas sofrem 11%”, aponta o pesquisador.

A ausência de água potável para consumo humano, presença de banheiro para uso exclusivo das famílias, manejo de lixo e histórico de malária estão entre os fatores diretamente relacionados ao estado nutricional. Além disso, infecções por vias respiratórias estão diretamente relacionadas aos casos de desnutrição e podem levar ao óbito.

“50% das crianças estão desnutridas, sendo que em algumas aldeias esse percentual chega a 80%. A cada três dias, uma criança Yanomami é removida de área por desnutrição grave combinada com outras doenças como malária e pneumonia”, afirma o procurador Alison Marugal, do MPF. “É a mortalidade infantil mais alta no mundo, são 133 óbitos por mil nascidos, não há nenhuma região no mundo assim”, completa.

Segundo o procurador, a Sesai cessou a distribuição de alimentação no último período, fazendo com que os indígenas ficassem ainda mais desassistidos. “Foi necessário que o Ministério Público ingressasse em juízo para que o fornecimento da alimentação fosse reestabelecido”, aponta.

Malária

Segundo o MPF, nos últimos dois anos, foram diagnosticados 44 mil casos de malária no território Yanomami, que conta com uma população de 30 mil indígenas. “Alguns indígenas adquiriram malária por três vezes ou mais. Por outro lado, o Distrito Sanitário Especial Indígena (Dsei) Yanomami é o mais caro do Brasil e, nos últimos três anos, recebeu R$ 260 milhões do governo”, afirma Alisson.

“É preciso uma auditoria nos Dseis, porque, se tem dinheiro, nós precisamos saber onde ele está sendo utilizado”, afirma o conselheiro nacional de Saúde Luiz Tucano, que representa a Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira (Coiab) no CNS.

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Descaso e abandono

Ausência de medicamentos e profissionais de saúde, nutricionistas e antropólogos e, principalmente, falta de transporte aéreo afetam a assistência aos povos da região, uma vez que 98% do território Yanomami é alcançado somente por via aérea.

“Desde 2019, o Dsei Yanomami não tem contrato para serviços aéreos. A falta de transporte aéreo deixa algumas aldeias sem serviços médicos por seis meses e pelo menos nos últimos dois anos não se faz saneamento básico no território por falta desta logística”, afirma o procurador.

“Infelizmente temos muitas limitações na coordenação de saúde indígena e uma delas é a dificuldade de diálogo com a Sesai. É importante essa aproximação, com troca de informações entre servidores e técnicos, para a Funai conseguir pensar e apoiar”, avalia a coordenadora de Saúde Indígena da Funai, Juliana Dutra.

Cisi

As discussões realizadas na reunião organizada pelo CNS serão aprofundadas na Cisi, que deverá encaminhar propostas para aprovação da mesa diretora e plenário do CNS. A 6ª Conferência Nacional de Saúde Indígena (6ª CNSI), evento participativo que deve ocorrer antes da etapa nacional da 17ª Conferência Nacional de Saúde (2023), vem sendo adiada por diferentes  motivos, dentre eles a mudança constante de chefe da pasta na Sesai, além da própria pandemia. 

“Vivemos um momento muito difícil, mas acredito que esta reunião seja um importante espaço de resistência e luta para avançarmos em ações que defendam a dignidade e a saúde de todos os brasileiros. A vida dos povos indígenas é uma pauta do Brasil”, afirma o presidente do CNS, Fernando Pigatto. 

Leia a Carta do Fórum de Lideranças Yanomami e Ye’kuana

Ascom CNS

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