RECOMENDAÇÃO Nº 043, DE 05 DE JUNHO DE 2020
Recomenda ao Congresso Nacional a derrubada de veto presidencial ao Projeto de Lei de Conversão da Medida Provisória 909/2019.
O Presidente do Conselho Nacional de Saúde (CNS), no uso de suas competências regimentais e atribuições conferidas pelo Regimento Interno do CNS e garantidas pela Lei nº 8.080, de 19 de setembro de 1990; pela Lei nº 8.142, de 28 de dezembro de 1990; pela Lei Complementar nº 141, de 13 de janeiro de 2012; pelo Decreto nº 5.839, de 11 de julho de 2006; cumprindo as disposições da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 e da legislação brasileira correlata; e
Considerando a Constituição Federal de 1988, Art. 196, segundo o qual a saúde é um direito de todos e dever do Estado, bem como o Art. 198, que estabelece que as ações e serviços de saúde são de relevância pública;
Considerando que desde que foram detectados os primeiros casos de COVID-19 provocada pelo novo coronavírus SARS-CoV-2, o mundo entrou em estado de alerta e, de acordo com diversos intelectuais, sofrerá transformações profundas;
Considerando que o Congresso Nacional, em 20 de março de 2020, decretou estado de calamidade pública (Decreto Legislativo nº 06/2020) no Brasil, que o Ministério da Saúde publicou a declaração de estado de transmissão comunitária em todo o país nessa mesma data e que esse decreto dispensou o cumprimento das metas de resultado primário pelo governo brasileiro;
Considerando que a Emenda Constitucional (EC) 106, de 07 de maio de 2020, instituiu o “regime extraordinário fiscal, financeiro e de contratações para enfrentamento de calamidade pública nacional decorrente de pandemia”, o que permite a expansão das despesas sem a observância dos limites legalmente estabelecidos, desde que não assumam caráter permanente, conforme disposto no Art. 3º;
Considerando que nos termos do Art. 4º da EC 106, está suspensa temporariamente a vedação estabelecida no inciso III do Art. 167 da Constituição Federal, o que possibilita a realização de operações de créditos que excedam o montante das despesas de capital como meio para o financiamento da expansão das despesas necessárias ao enfrentamento da pandemia do Covid-19;
Considerando que o Brasil possui um tecido social marcado por profundas desigualdades regionais, raciais, de gênero etc., que se traduzem em determinantes sociais da saúde que precisam ser considerados no enfrentamento à pandemia provocada pelo novo coronavírus SARS-CoV-2, agente etiológico da COVID-19;
Considerando que esse cenário apresenta um risco grave para o acesso dos brasileiros e brasileiras às melhores opções de prevenção e tratamento, bem como para a sustentabilidade do orçamento do SUS, já largamente comprometido pelo subfinanciamento crônico e, ainda mais, após a vigência da Emenda Constitucional 95/2016, que já retirou R$ 22,5 bilhões do SUS;
Considerando que a importação de medicamentos, respiradores, tecnologias, insumos, dispositivos médicos, kits de testagens, equipamentos de proteção individual, dentre outros, exigem recursos orçamentários e financeiros suficientes para atender um país com dimensões continentais como é o Brasil;
Considerando que os Estados, Distrito Federal e Municípios, cujos profissionais e unidades de saúde estão na linha de frente do combate à Covid-19, necessitam de recursos para financiar a expansão das ações e serviços de saúde em curso, bem como para a reposição de materiais, medicamentos, equipamentos de proteção individual e outros insumos requeridos para o atendimento da população e para a manutenção e substituição de equipamentos médico-hospitalares que estão passando por um processo de depreciação acelerada pela intensidade de uso;
Considerando que o Presidente da República vetou o Projeto de Lei de Conversão (PLV) referente à Medida Provisória nº 909, aprovado pelo Congresso Nacional, que estabelecia a destinação de R$ 8,6 bilhões integralmente aos Estados, Distrito Federal e Municípios “para a aquisição de materiais de prevenção à propagação da covid-19”, sob os argumentos de “violação aos princípios da reserva legal e do poder geral de emenda” e de criação de “despesa obrigatória ao Poder Público” sem demonstrar o impacto orçamentário e financeiro “no exercício corrente e nos dois subsequentes”, argumentos esses em desacordo com a flexibilização estabelecida tanto pela decretação de estado de calamidade pública pelo Cogresso Nacional, quanto pela Emenda Constitucional 106/2020;
Considerando que o veto presidencial expressa elementos da política econômica de austeridade fiscal inadmissíveis em qualquer tempo e que estão em oposição à emergência sanitária declarada pelo Congresso Nacional para o enfrentamento e combate à pandemia da Covid-19, ao orçamento de guerra e à Lei nº 13.979, de 2020;
Considerando que o veto presidencial significa deslocar recursos do combate à emergência sanitária para pagamento de juros e amortizações da dívida pública, sendo essa escolha alocativa uma afronta às necessidades de segurança sanitária ínsita ao direito fundamental da saúde, com mortes evitáveis;
Considerando que a destinação desse recurso para amortização da dívida pública, cujo mecanismo de operações compromissadas fará com que a dívida não seja reduzida, constitui uma demonstração inequívoca e insensível da escolha política dos interesses do capital financeiro, ao garantir o lucro de curto prazo dos bancos, ao invés de salvar milhares de vidas humanas; e
Considerando as atribuições conferidas ao presidente do Conselho Nacional de Saúde pela Resolução CNS nº 407, de 12 de setembro de 2008, Art. 13, Inciso VI, que lhe possibilita decidir, ad referendum, acerca de assuntos emergenciais, quando houver impossibilidade de consulta ao Plenário, submetendo o seu ato à deliberação do Pleno em reunião subsequente.
Recomenda ad referendum do Pleno do Conselho Nacional de Saúde:
Ao Congresso Nacional, que, mediante as razões aqui apresentadas, derrube o veto do Presidente da República ao Projeto de Lei de Conversão aprovado em maio pelo Poder Legislativo (PLV 10/2020) referente à Medida Provisória nº 909/2019.
FERNANDO ZASSO PIGATTO
Presidente do Conselho Nacional de Saúde
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