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RECOMENDAÇÃO Nº 003, DE 24 DE JANEIRO DE 2020

Recomenda medidas acerca do uso da modalidade Educação a Distância (EaD) nos cursos de graduação da área da saúde.
 

O Plenário do Conselho Nacional de Saúde (CNS), em sua Trecentésima Vigésima Quinta Reunião Ordinária realizada nos dias 23 e 24 de janeiro de 2020, em Porto Alegre/RS, durante as atividades do Fórum Social das Resistências, no uso de suas competências regimentais e atribuições conferidas pela Lei nº 8.080, de 19 de setembro de 1990; pela Lei nº 8.142, de 28 de dezembro de 1990; pela Lei Complementar nº 141, de 13 de janeiro de 2012; pelo Decreto nº 5.839, de 11 de julho de 2006; cumprindo as disposições da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, da legislação brasileira correlata; e

Considerando que o art. 200, inciso III da Constituição Federal de 1988 (CF/1988), estabelece que compete ao Sistema Único de Saúde (SUS), ordenar a formação dos profissionais da área de saúde;

Considerando que o art. 227 da CF/1988 determina que a educação e a profissionalização são direitos que devem ser garantidos com absoluta prioridade aos cidadãos brasileiros;

Considerando a Lei nº 8.080, de 19 de setembro de 1990, que regula, em todo o território nacional, as ações e serviços de saúde, e a Lei nº 8.142, de 28 de dezembro de 1990, que dispõe sobre a participação da comunidade na gestão do SUS, de forma a articular políticas e programas de interesse para a saúde, cuja execução envolva áreas não compreendidas no âmbito do SUS, tais como, por exemplo, aquelas de responsabilidade direta do Ministério da Educação (MEC);

Considerando que a Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996 (LDB), estabelece as diretrizes e bases da educação nacional, dispondo sobre a educação profissional e tecnológica com a finalidade precípua de preparar para o exercício de profissões, contribuindo para que o cidadão possa se inserir e atuar no mundo do trabalho e na vida em sociedade;

Considerando que o CNS, por meio de sua Comissão Intersetorial de Recursos Humanos e Relações de Trabalho (CIRHRT/CNS), discute permanentemente o tema da educação a distância, enquanto modalidade de ensino ou como uso de Tecnologias de Informação e Comunicação (TIC), em cursos presenciais, já tendo aprovado inúmeros documentos que refletem seu posicionamento, conforme serão detalhados a seguir;

Considerando a Resolução CNS nº 515, de 7 de outubro de 2016, na qual o CNS posiciona-se contrário à autorização de todo e qualquer curso de graduação da área da saúde na modalidade Educação a Distância (EaD), pelos prejuízos que tais cursos podem oferecer à qualidade da formação de seus profissionais, bem como pelos riscos que estes profissionais possam causar à sociedade, imediato, a médio e a longo prazos, refletindo uma formação inadequada e sem integração ensino/serviço/comunidade;

Considerando que a referida Resolução CNS nº 515/2016 admite, para os cursos de graduação na área da saúde, autorizados na modalidade presencial, um percentual de até 20% de carga horária com uso de tecnologias de informação e comunicação, observando que não sejam abrangidas, neste caso, disciplinas de caráter assistencial e de práticas que tratem do cuidado/atenção em saúde individual e coletiva;

Considerando que a Resolução CNS nº 515/2016 também dispõe sobre as Diretrizes Curriculares Nacionais (DCN) dos cursos de graduação da área da saúde, definindo que as mesmas sejam objeto de discussão e deliberação do CNS, de forma sistematizada, dentro de um espaço de tempo adequado para permitir a participação, no debate, das organizações de todas as profissões regulamentadas e das entidades e movimentos sociais que atuam no controle social, para que o Pleno/CNS cumpra suas prerrogativas e atribuições de deliberar sobre o SUS, cuja responsabilidade constitucional também alberga a de regular os profissionais da área da saúde;

Considerando a Moção nº 20, de 10 de novembro de 2017, que manifesta reconhecimento e apoio do CNS à aprovação do Projeto de Decreto Legislativo nº 111/2017 e aos Projetos de Lei nº 7.121/2017, nº 5.414/2016 e nº 6.858/2017, com o objetivo de que os cursos de graduação da área da saúde sejam ministrados somente na modalidade presencial, de forma a garantir segurança e resolubilidade na prestação dos serviços de saúde à população brasileira;

Considerando a Resolução CNS nº 569, de 08 de dezembro de 2017, que reafirma a prerrogativa constitucional do SUS em ordenar a formação dos (as) trabalhadores (as) da área da saúde, aprovando o Parecer Técnico 300/2017, que apresenta princípios gerais a serem incorporados nas DCN de todos os cursos de graduação da área da saúde, como elementos norteadores para o desenvolvimento dos currículos e das atividades didático-pedagógicas, e que deverão compor o perfil dos egressos desses cursos, ao mesmo tempo que aprova os pressupostos, princípios e diretrizes comuns para a graduação na área da saúde, construídos na perspectiva do controle/participação social em saúde;

Considerando a Recomendação nº 065, de 8 de dezembro de 2017, que recomenda ao Congresso Nacional a regulamentação, com urgência, do inciso III do Art. 200 da Constituição Federal, de modo a garantir que o processo de ordenamento da formação de profissionais da área da saúde para o SUS se consubstancie em competência objetiva das instâncias do SUS, conforme prevê a Carta Magna de 1988; e à Procuradoria Geral da República para que proponha Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI), junto ao Supremo Tribunal Federal, no sentido de anular os atos administrativos que regulamentam a modalidade à distância para os cursos de graduação na área da saúde, tendo em vista que essas normativas usurpam a competência constitucional do SUS para ordenar a formação dos seus trabalhadores e a competência legal do CNS para garantir a participação popular e o controle social no processo de construção das ações e políticas de formação para o trabalho em saúde;

Considerando a Recomendação nº 069, de 13 de dezembro de 2017, que recomenda ao Sr. Ministro de Estado da Educação, ad referendum do Pleno do CNS, que declare moratória, ou seja, suspensão provisória, à autorização de cursos de graduação da área da saúde, na modalidade Educação a Distância (EaD), até que seja devidamente construído e aprovado um dispositivo legal que contemple a pactuação da utilização das tecnologias de informação e comunicação no processo educativo, considerando o que prevê o artigo 200, inciso III, da Carta Magna de 1988, bem como o artigo 14 da Lei nº 8.080/1990 e o artigo 80 da Lei nº 9.394/1996 (LDB), no que diz respeito à formação profissional em saúde;

Considerando o Decreto nº 9.235, de 15 de dezembro de 2017, que dispõe sobre o exercício das funções de regulação, supervisão e avaliação das instituições de educação superior e dos cursos superiores de graduação e de pós-graduação no sistema federal de ensino, dando a prerrogativa ao CNS de avaliar e emitir parecer opinativo sobre os atos regulatórios de autorização e reconhecimento de cursos de graduação de enfermagem, odontologia, medicina e psicologia;

Considerando que, com base no referido Decreto nº 9.235/2017, o CNS tem recebido para avaliar, via sistema e-Mec, processos de autorização e reconhecimento de cursos de enfermagem e psicologia, na modalidade EaD, os quais têm sido devolvidos ao MEC, por meio de Ofício, com as devidas justificativas;

Considerando que o Parecer Técnico nº 300/2017, aprovado na referida Resolução CNS nº 569/2017, em sua diretriz III, trata da integração ensino/serviço/comunidade, postulando que para a consolidação do SUS, é primordial investir na formação e desenvolvimento de seus profissionais, embasada na construção de habilidades e atitudes, por meio de ações educativas compreendidas, para além do sentido clássico da aquisição de conhecimentos técnico-científicos, mas também como um processo de formação de sujeitos críticos e reflexivos, de transformação da realidade e de criação de novas formas de gestão dos processos de trabalho;

Considerando que o referido Parecer Técnico 300/2017, justifica que os estudantes de cursos de graduação na área da saúde devem ser inseridos nos cenários de práticas do SUS e outros equipamentos sociais desde o início da formação, rompendo com a dicotomia teoria-prática, uma vez que a diversificação dos futuros espaços de trabalho permite aos alunos vivenciar, desde sua formação, as políticas de saúde e de organização do trabalho em equipe interprofissional e que, da mesma forma, a atuação junto à comunidade lhes garantirá conhecimentos e compromissos com a realidade de saúde do seu país e sua região, o que dá ainda maior relevância às DCN dos cursos de graduação da área da saúde, que devem valorizar a carga horária destinada às atividades práticas, à participação em atividades de extensão e aos estágios curriculares;

Considerando que a EaD tem sido amplamente discutida no âmbito do CNS e, no ano de 2018, o Pleno/CNS aprovou a Nota Pública Contra a Graduação a Distância na Área da Saúde, assinada por 58 entidades, dentre associações de ensino, conselhos profissionais, federações das profissões da área da saúde, entidades estudantis e movimentos sociais, que a produziram, em conjunto, retratando o posicionamento contrário à EaD na graduação em saúde por parte dos próprios profissionais da área, educadores e estudantes, que reconhecem a responsabilidade inerente à formação integral de um profissional de saúde competente e compromissado com as necessidades de saúde da sociedade brasileira;

Considerando que a Portaria nº 1.428, de 28 de dezembro de 2018, ora revogada, dispunha sobre a oferta de disciplinas na modalidade a distância em cursos de graduação presenciais, admitindo ampliação da carga-horária total do curso de 20% para 40%, desde que observados alguns critérios para os cursos em geral, e ressalvando, em seu art. 6º, que a possibilidade de ampliação da oferta de disciplinas na modalidade a distância não se aplicaria aos cursos de graduação presenciais da área da saúde e das engenharias;

Considerando que a atual Portaria nº 2.117, de 6 de dezembro de 2019, estabelece que as instituições de ensino superior poderão introduzir a oferta de carga horária na modalidade de Educação a Distância (EaD) na organização pedagógica e curricular de seus cursos de graduação presenciais, até o limite de 40% da carga horária total do curso, inclusive em cursos da área da saúde, com exceção dos cursos de medicina;

Considerando as recentes manifestações, postadas em páginas oficiais e redes sociais, das entidades representativas dos profissionais de saúde brasileiros, à exemplo, a “Nota de Repúdio ao Ministério da Educação - Educação de qualidade é direito de estudantes em formação e salvaguarda do direito a oferta de cuidados de enfermagem seguros para a população”, da Associação Brasileira de Enfermagem (ABEn); a Nota de Repúdio da Federação Nacional dos Enfermeiros (FNE), que manifesta total repúdio à Portaria nº 2.117/2019 do MEC; a Nota de Repúdio da Associação Brasileira de Ensino de Psicologia (ABEP); a Nota de Repúdio do Conselho Federal de Fisioterapia e Terapia Ocupacional (COFFITO), entre outras;

Considerando as ações judiciais que poderão ser impetradas contra a Portaria nº 2.117/2019 do MEC, pelas entidades da área da saúde, a exemplo, do Conselho Federal de Fonoaudiologia (CFFa), que decidiu assim fazê-lo, em sua 170ª sessão plenária, ocorrida em 14 de dezembro de 2019; e

Considerando o Projeto de Decreto Legislativo, de 17 de dezembro de 2019, de autoria do Senador Humberto Costa, protocolado no Senado Federal que susta, nos termos do inciso V do art. 49 da CF/1988, a Portaria nº 2.117/2019 do MEC, pois a alteração instituída pela referida portaria, no âmbito do percentual de carga horária na modalidade EaD permitido em cursos de graduação presenciais, excede os limites a serem respeitados pelo Poder Executivo no exercício de sua função regulamentadora, afrontando as normas gerais da educação nacional e colocando em risco a qualidade do ensino.

Recomenda

Ao Ministro de Estado da Saúde:

Que se posicione oficialmente, em nome do Ministério da Saúde, quanto ao uso da modalidade Educação a Distância (EaD) nos cursos de graduação da área da saúde, dando ampla visibilidade a essa disposição.

Às entidades que compõem o Conselho Nacional de Saúde, aos (às) Conselheiros (as) Estaduais, do Distrito Federal e Conselheiros (as) Municipais de Saúde:

Que se articulem politicamente, junto às suas bases eleitorais nacionais, estaduais e municipais, em apoio ao PDL protocolado no Senado Federal, que propõe sustar a Portaria nº 2.117, de 6 de dezembro de 2019.

Ao Ministro de Estado da Educação:

Que considere os argumentos e dispositivos constitucionais e legais aqui dispostos e revogue a Portaria nº 2.117, de 6 de dezembro de 2019.

Ao Ministério Público Federal - Procuradoria Federal dos Direitos dos Cidadãos:

Que proceda aos atos de sua competência junto ao MEC no sentido de recomendar a revogação da Portaria nº 2.117, de 6 de dezembro de 2019, tendo em vista os riscos que ela representa aos processos de formação de profissionais na área da saúde.

Plenário do Conselho Nacional de Saúde, em sua Trecentésima Vigésima Quinta Reunião Ordinária, realizada em Porto Alegre nos dias 23 e 24 de janeiro de 2020.

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